Com pouca ventilação e água quente, crianças passam mal nas escolas de SP

A forte onda de calor dos últimos dias trouxe à tona a ausência de infraestrutura na educação. A falta de ventilação adequada ou bebedouros com água gelada, por exemplo, torna a permanência na escola um desafio em meio à sensação térmica acima dos 45°C.

O que aconteceu:

Dados do Censo Escolar 2023 apontam que 70% das salas de aula das instituições públicas de ensino do país não são climatizadas.

"No ano passado, em uma das reuniões de pais, vimos a situação do calor na sala e questionamos a direção. Disseram que não tem ar-condicionado porque a fiação da escola é antiga. Eu disse que não era luxo, era necessidade. Este ano está pior", contou a mãe de uma aluna da Escola Estadual Domingos de Souza, no Guarujá (SP).

Na sala da filha dela são 40 alunos e quatro ventiladores, que não dão conta de arejar o ambiente. "A minha sobrinha foi hoje e disse que as cadeiras estavam quentes, e que não conseguia pensar com o calor", disse.

Na Escola Municipal Leonardo Nunes, em Santos (SP), a situação é semelhante. "Nenhuma sala possui ar-condicionado, apenas a secretaria. Na sala da minha filha tem três ventiladores, mas apenas dois estavam funcionando. Na última reunião de pais cobramos o ar e os bebedouros, porque a água é extremamente quente. Disseram que a questão é a instalação, pois a fiação é antiga e não suporta".

A mãe de uma estudante da Escola Municipal Luiz Beneditino Ferreira, em São Vicente (SP), destaca a falta de água e ventilação na unidade. "Minha filha de cinco anos e alguns amiguinhos relataram que algumas salas de aula estão sem ventilador e o filtro só sai água quente. Na entrada da escola uma menininha falou que estava passando mal, pois a sala é muito quente".

Protesto e pedido de ajuda para comprar ventilador

A corretora de imóveis Michelle Petrizzo utilizou as redes sociais para compartilhar a situação da Escola Municipal República de Portugal, em Praia Grande (SP). Na semana passada foi surpreendida pelo relato da filha ao sair da unidade.

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"Cheguei na escola mais cedo para buscá-la, devido a um imprevisto no trabalho, e ela veio molhada de tanto suor, pálida e visivelmente desidratada, conta Michelle.

Segundo a mãe, na sala da filha há somente um ventilador e, em outra, não há janela. O tema foi pauta da reunião de pais.

Fui na reunião e não aguentei ficar por 10 minutos na sala por conta do calor. Praticamente não há ventilação natural. Os pais sugeriram uma vaquinha para comprar ar-condicionado para as salas e foi negado. Disseram que já está em processo de compra, mas ouço isso há quatro anos e a situação só piora.

No WhatsApp, um grupo reúne cerca de 100 mães de diversas escolas de Praia Grande, que trocam informações sobre a situação. Há, inclusive, fotos de crianças que teriam saído das unidades com brotoejas devido ao calor. Elas organizaram um abaixo-assinado online para chamar atenção para a situação. O documento já tem mais de sete mil assinaturas.

"A sala da minha filha é um forno. A escola também é creche e tem crianças que ficam o dia inteiro. O bebedouro é água quente de galão. Minha filha sai exausta de calor e as professoras molhadas de suor. Um absurdo. E, detalhe, a secretaria mandou bilhete pedindo 10 reais de contribuição para a compra de ventiladores", conta a mãe de uma aluna da Escola Municipal Oswaldo Justo, em Praia Grande.

Pais dos alunos da Escola Municipal Oswaldo Justo, em Praia Grande, receberam bilhete pedindo R$ 10 para auxiliar na compra de ventiladores
Pais dos alunos da Escola Municipal Oswaldo Justo, em Praia Grande, receberam bilhete pedindo R$ 10 para auxiliar na compra de ventiladores Imagem: Arquivo Pessoal
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Saída de ambulância

Na última quarta-feira (12), diversos alunos da Escola Municipal Caic Ayrton Senna da Silva, em São Vicente (SP), passaram mal, com sintomas como náusea e tontura, devido ao calor. Pais e responsáveis foram chamados para buscar as crianças. Uma aluna teve crise convulsiva e foi socorrida pelo SAMU e encaminhada ao pronto-socorro.

"Assim que meu filho se queixou que estava passando mal, a escola entrou em contato comigo para buscá-lo. Há pouco menos de três anos, a escola recebeu a reforma, e eles disseram que faltava instalar o ar. Conseguiram instalar alguns ventiladores, mas não ventila a sala inteira. A do meu neto recebe sol o dia inteiro e só tem um ventilador. Não existe pátio coberto para as crianças, se quiser fugir do sol e do calor tem que procurar sombra do lado de fora do prédio", relatou uma mãe.

Está muito difícil. Alunos e professores passando mal. Na sala tem apenas dois ventiladores que não giram. O calor é insuportável, relata uma professora.

A escola possui 46 salas, que acomodam de 30 a 35 alunos, e tem quase 1.400 estudantes matriculados, sendo 55 especiais.

Outro lado

Segundo a Prefeitura de Santos, 87% das escolas do município estão climatizadas. Onze aguardam a instalação de novos aparelhos de ar-condicionado - uma delas é a UME Leonardo Nunes, cuja instalação dos equipamentos está prevista para até junho.

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A Prefeitura de Praia Grande informou que todas as unidades de ensino contam com ventiladores nas salas de aula, e que duas escolas receberam os equipamentos de ares-condicionados para que a administração possa avaliar o impacto orçamentário e na infraestrutura, bem como a adaptação de alunos e servidores.

A prefeitura Informou também que tem feito uma força-tarefa para a instalação de mais 245 ventiladores, que vão beneficiar diretamente alunos de 45 escolas. No que diz respeito aos bebedouros, a nota ressaltou que "todas as escolas municipais contam com o aparelho que fornece água gelada e a manutenção dos mesmos ocorre periodicamente".

Já a Prefeitura de São Vicente informou que mais de 440 salas de aulas das escolas do município são climatizadas com aparelhos de ar-condicionado, e que as que ainda não têm dispõem de dois ventiladores em cada para refrescar o ambiente.

A nota destacou ainda, que diante do cenário de altas temperaturas registradas nos últimos dias, pais e responsáveis de alunos que estudam em escolas que ainda não foram climatizadas podem optar por não levar os filhos à escola até o dia 28 de fevereiro.

"A decisão não prejudicará o estudante, visto que, pensando no bem-estar e conforto das crianças, a Administração Municipal optou por não contabilizar falta. Além disso, todo o conteúdo aplicado será recuperado ao longo do trimestre".

Escolas estaduais

Com relação às escolas Domingos de Souza, em Guarujá, e Vila Tupi, em Praia Grande, citadas na reportagem, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) informou que as unidades contam com quatro ventiladores funcionando por sala, e que, na Baixada Santista, das 147 escolas estaduais existentes, 30 estão sendo climatizadas.

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O Estado informou ainda que "ampliou em quase 70 vezes o número de escolas estaduais climatizadas em todo o estado" e que tem realizado adequações para enfrentar o aumento do calor nas unidades educacionais da rede.

Segundo o Governo do Estado, em 2023, somente nove unidades contavam com ar-condicionado em todas as salas de aula. Atualmente, esse número subiu para 624, e, até o fim do ano, mais 432 escolas devem ser beneficiadas, totalizando mais de mil unidades climatizadas e em pleno funcionamento. "Cerca de R$ 350 milhões estão sendo investidos nesse projeto, que é implementado em etapas, priorizando as escolas localizadas nas regiões mais quentes do estado", diz a nota.

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