Descrição de chapéu COP30 mudança climática

Água a R$ 17 infla acordo de R$ 480 mi do governo com organização para montagem da COP30

Governo diz que preços são estimativas e devem cair na contratação final; escolhida sem licitação, OEI (Organização dos Estados Ibero-Americanos) recebe 5% do valor do convênio

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Brasília

O valor previsto para o convênio de R$ 480 milhões para a montagem da COP30, a conferência sobre clima da ONU (Organização das Nações Unidas) em Belém, foi inflado por uma estimativa de custos que incluiu a compra de garrafas d’água de 500 ml cotadas a R$ 17,50 cada uma.

O acordo foi assinado entre o governo e a OEI (Organização dos Estados Ibero-Americanos), entidade contratada sem licitação para gerir a instalação do evento e que cobra uma taxa de 5% sobre o valor executado nas obras e serviços.

Imagem aérea de uma grande área em construção, com várias estruturas em andamento. No primeiro plano, há campos de esportes e áreas verdes. Ao fundo, uma cidade com prédios e nuvens no céu.
Obras no Parque da Cidade, espaço que sediará a programação da COP30 em Belém - Ricardo Stuckert - 14.fev.25/Divulgação/PR

No fim de março, o TCU (Tribunal de Contas da União) questionou o governo justamente sobre os critérios adotados para definir o preço do convênio. O acordo permite que a OEI contrate as empresas que vão montar a infraestrutura do evento que será realizado na capital do Pará em novembro.

Documentos obtidos pela Folha por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação) mostram que o valor total foi definido a partir de uma planilha sobre o "orçamento estimado" para a montagem dos espaços da COP30, a locação de equipamentos, a compra de alimentos e a contratação de serviços.

Para firmar o convênio, a OEI apresentou estimativa de despesas de R$ 22,5 milhões com alimentação dos delegados, camarins e pagamento da equipe que trabalhará na COP.

Apenas a compra de água, com estimativas acima do valor do mercado e de outras compras públicas, custaria cerca de R$ 4 milhões. Além da garrafa de 500 ml a R$ 17,50, a tabela estima despesas de R$ 167,50 com o garrafão de 20 litros e de R$ 13,50 com o fornecimento de água de 300 ml em garrafas e taças de vidro.

Em nota, a Secretaria Extraordinária para a COP-30, vinculada à Casa Civil da Presidência da República, afirma que os valores são apenas estimativas "utilizadas para definir o montante do projeto de cooperação" com a OEI.

"Esses valores são meramente referenciais e não necessariamente os que serão adotados pela OEI nas licitações da COP30", afirma a secretaria.

"Não procede a afirmação de que os valores eventualmente considerados pela reportagem como 'acima do mercado' resultam em um aumento do saldo disponível para o projeto de cooperação. Quando o repasse for realizado, próximo à celebração dos contratos com as empresas vencedoras dos dois lotes da licitação nº 11060/2025, ele será baseado nos valores unitários praticados no certame", diz.

Ainda que a estimativa de preços tenha sido meramente burocrática, os valores foram usados para definir o tamanho total do convênio entre o governo e a OEI.

O órgão afirma que usou como referências as contratações feitas para reuniões do G20 no Brasil, além de edital do Ministério da Gestão e Inovação para contratação de serviços a grandes eventos em 2025.

No primeiro caso, porém, a água de 500 ml foi cotada a R$ 3,03, enquanto o MGI levou o valor de R$ 9,72 para a sua licitação e conseguiu oferta de R$ 4.

A OEI afirma que "os itens listados [antes de celebrar o convênio] são orçados de maneira referencial e não representam os valores que serão de fato praticados pela OEI nas licitações da COP30, podendo ser diminuídos no próprio processo licitatório".

A entidade também diz que se baseou em eventos internacionais de "porte semelhante" para projetar os custos da COP30. "Todos os processos de contratação estão abertos ao TCU e quaisquer recomendações do órgão serão integralmente atendidas", afirma a OEI.

A organização que assinou o acordo com o governo tem sede em Madri, na Espanha, e escritórios regionais em diversos países. A OEI já era parceira do governo brasileiro em outras ações. Na conta de Instagram da OEI, há fotos do secretário-geral da OEI, Mariano Jabonero, ao lado de Lula (PT) e da primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja.

O extrato do acordo de cooperação internacional com a organização foi publicado em 24 de dezembro no Diário Oficial da União. Em janeiro, a entidade abriu uma licitação para contratar duas empresas que vão montar os setores da COP destinados às negociações oficiais e aos eventos com a sociedade civil.

Como o acordo prevê o repasse de 5% do valor do convênio à OEI, o pagamento alcançará R$ 22,7 milhões se todo o montante for consumido.

Em nota técnica, a pasta do governo que gere a COP disse que esta taxa "representa uma abordagem mais eficiente, em termos de custos, em comparação com as taxas praticadas em acordos similares com instituições do terceiro setor e fundações".

Para mostrar a diferença entre o preço estimado antes de firmar o convênio com aquele que será desembolsado na compra final, a pasta disse que a OEI cotou a água de 500 ml a R$ 7,02 e R$ 8,92 na licitação aberta para seleção das empresas que vão montar a COP.

A disputa entre as empresas pelos contratos da COP ainda está aberta.

Para firmar o acordo, a organização ainda apontou que cada metro quadrado do "piso elevado" da estrutura onde o evento será realizado custaria R$ 500. A montagem total tem despesas estimadas em R$ 50 milhões. Já na licitação, esse tipo de piso teve preços de referência fixado entre cerca de R$ 250 e R$ 360 por metro quadrado.

A documentação sobre o convênio também estimava a compra de dois modelos de "caderneta tipo moleskine", sendo um a R$ 17,40 por unidade e outro a R$ 112,50. Na licitação, a OEI passou a estimar os preços em cerca de R$ 43 e R$ 45 por cada tipo de caderneta.

Para firmar o acordo com a OEI, o governo argumentou que a entidade tem "expertise" na produção de eventos similares e que a "sustentabilidade é um dos pilares fundamentais da atuação" da organização.

O governo ainda citou decreto editado em março de 2024 pelo presidente Lula para permitir a celebração de "projetos de cooperação" com organismos internacionais para a organização de eventos da COP30, G20 e do Brics. O texto estabelece que as entidades podem cobrar uma taxa de administração de até 10% sobre os valores executados nos projetos.

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Comentários

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JAILSON DE BEZERRA

8.abr.2025 às 18h52

Sai governo, entra governo. O roubo é o mesmo, desculpas dizendo a mesma ladainha com verbos e pronomes sinônimos. O que muda é a sintaxe e as concordâncias de fechamento de contratos. E os bobos, também os mesmos, culpam partidos e ideologias que nem mesmo eles entendem. São a mesma sopa com o gosto amargo do caldo do sangue de nós trabalhadores.